terça-feira, 14 de dezembro de 2010

sábado, 24 de abril de 2010

O DOM

Os compassos de uma música estelar
descem pela atmosfera melados de luz.
Os átomos do pensamento das flores
preparam os colchões macios invisíveis.
O outono é árduo, desconexo e rude...
A gentileza está à espera, para acordar,
de uma fonte de vigorosas melodias.
É um dom trazer canções das estrelas!

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Microtestemunho

Uns dizem que viemos para resgatar dívidas.
Outros que para amar o próximo,
fazer nosso dever, nascer e morrer.
Prestar serviço, servir a Deus ou, tão somente,
cumprir seus desígnios, e até - pode ser! -
preencher o tempo da vida orgânica.
O autor deste poema só queria viver,
amar a vida e tudo o que a concerne.

domingo, 28 de março de 2010



TABAPUÃ

Tem um lugar no meio do nada
onde há tudo que a vida requer:
calor, praça, lonjura, espera, paz.

Espaço oco que serve de ninho
para o sol por seus ovos de luz,
chocar filhos de energia mansa.

Onde quem está quer sair,
quem entra quer ficar...
e pode ser a mesma pessoa.

Onde está quem nunca foi,
que viria pra sempre depois,
mas foi ficando, permaneceu.

Neste recanto plantaram ruas,
semearam quarteirões e casas,
para que habitantes florissem.

Protegendo a cidadela, as canas
doces, bois inermes de guampa,
dóceis, e da cor da paz ecológica.

Em vez de mar, canavial bravio.
Como ilhas, seringais sombrios.
Farol? A luz de quem vem longe.

Todos são paragens sem saudade.
Palmares de Zumbi, ou Macondo
de Cem Anos de Solidão, pronto:

Temos mais que Maracangalha.
Temos Conselheiro no próximo.
Vive-se fraternidade de Canudos.

Cada qual no fundo tem um lugar
Que um dia emerge e se espalha,
Para os lados, para cima e abaixo.

Era fantasia e hoje, mais que real,
Toma conta de muitos dos avessos
que escondemos a qualquer preço.

Precisamos deixar o coração levar
A carne que nasceu numa origem,
O espírito que navega sem zarpar.

Num breve acaso, mais que mero,
Encontramos sem pressa o rumo,
Começamos tudo de novo, do zero.


(Foto da Fazenda Água Milagrosa: Rogério Dutra Pereira)

quinta-feira, 25 de março de 2010

ESTAR VIVO É BUSCAR PERGUNTAS

O que buscam os cavalos
arfando na colina, com os olhos cheios?

O que buscam as nuvens
que pareciam ignorar os cavalos?

E quando as nuvens desabam
e encontram os cavalos distraídos...?

Assim será enquanto arfo inundado
por esse às-pazes de potências.

Estar vivo é fazer perguntas.
É buscar fazê-las em paz.

Deixar de correr atrás da poesia
para que as nuvens encontrem,
sossegadamente, os cavalos.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

SETA TURCA
(permanecimento)

Do alto do corcel, tocha em riste,
Cresce para o céu a nova Anita,
A desbravadora das camadas tântricas.
Faz punção de aventuras no destino.
Na sela pôs colares e guirlandas
Porque precisa descansar da sedução
Para conquistar a pradaria estelar.
Veste somente uma túnica de finas nuvens.
Jogado sobre as costas, o embornal
Onde guarda as setas turca e as tâmaras.
Ninguém resistirá à sedução da sua paciência,
Tão fragilzinha, tão pequena, tão risonha,
Tão devastadoramente atuante.
O PRANTO DAS ÁGUIAS

Não deu para ir ao Paraíso.
Estou juntando os trapos,
e os equipamentos de viver.
Vou partir da cidade,
e choro muito o pranto das águias.
Possivelmente terei condições bem mais incômodas
de passar os meus dias,
mas essa situação é temporária
- uma parada supersônica para a transformação.
A reflexão é melhor do que o impulso,
mas a ação é melhor do que a reflexão.
Ação transformadora - o vôo!
superando filosofia e paixão.
A ética da responsabilidade
está presente na estrutura da consciência
e a paixão na do amar.
Desfraldo-me no seu lábaro
e respiro o bálsamo que trouxe do Paraíso
na mais recente conexão.
EXISTÍ-LA

Existir esta mulher.
Existir sua independência.
Existir o vir de longe,
De onde o destino se esconde.

Existe-a, existo-te, exista-lhe.
Até esfarelarem-se os propósitos,
Esta mulher torna-se o depósito
De meus complexos detalhes.

Minha vida sendo sua exterioridade,
Repleta da essência que extravia,
Remetente dos sentidos que me instalam
No endereço que lhe cabe.

Existir essa transferência
Do morar e do morrer em mim,
Como atitude de espera de que precise
Da lacuna onde toda existência é crise.

sábado, 20 de fevereiro de 2010



ESCUTA
para Tatiana

Menino, se você me ouve,
Tira a prova dos nove:
Qual é o tamanho do desejo?

Menino, você já nasceu
Neste ventre verde ou
Nasce enquanto vivo?

Sua pequenina proporção
Me faz viajar pra fora
De todos os distúrbios.

Quando estiver sentindo
Os pensamentos de água
Estaremos mais perto...

Próximos de um lugar melhor
De um coração de pássaro,
Das asas de quem te desejou.

Menino, que saudade de você,
E da sua inexistência teimosa.
Por que o mundo não te chama?

Desencarno meu otimismo
Do corpo torturado.
Descolo minha alegria da pele renegada.

Desgrudo minha força
Do sangue despejado
Sem a vinda de sua vida.
Se me ouve, pisque uma luz.
Ah, eu já te vejo...
De fato você é um farol!

Será bom quando ouvir
O mundo clamando por ações.
E ele já te chama por mim.

Vamos morar no ventre da mata.
Vamos construir uma sede nova
Para os rios e as cachoeiras.

Vamos ter sede de solidariedade
Junto de muitas mães como a sua.
Depois comer o pão da generosidade.

Fique por enquanto sereno.
Já já ligaremos os corações,
E sairemos amando pelo pasto.







FADAS DE JULHO


A vida se encolhe
No fundo da noite
Diante do mar escuro,
Conchas fazendo barulho.

A quantas anda a Terra pequena
Que avistamos com a lupa?
Fadas de julho,
Do nada surgem as Anas.

De almas doces, amenas,
Na garupa das ondas,
Uma a cabana da outra,
Como pérolas em casulos.

Tão difícil é viver!
Que ninguém se esconda,
Que ninguém se encolha.
Sejam verão neste inverno!

Sol trincando o chão de folhas,
De azul-eterno é este apego.
Tudo tão pequeno, tão extremo,
Mas nada nos tira daqui.

De que vale isto mesmo?
Talvez seja como um prêmio
A procura obscura
Do amor que não vemos.



segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A MEDIDA DO AMOR

Será possível pesar o amor,
medir suas medidas?
Como saber quem amamos mais,
aquele que mais ama?
Porém, a frágil e sublime importância de viver
mede-se assim: pelo amor.
Esta é a autêntica identidade, e cada um tem a sua.
Assim como resgatamo-nos na figura amada,
há o resgate dela quando disto se apercebe.
Humildemente, só há amor quando o próximo apela
na obra que é presença, e que se chama Identidade.
A medida - conclui-se - é nos salvarmos
para que o outro continue a poder salvar-se em nós.