terça-feira, 22 de setembro de 2009


POEMA DE ESPANTAR CAVALOS



Por lá, não há ardores nem perfídias.
Nas almas, decantam energias frugais:
A brisa que tolhe as crinas dos corcéis,
A fumaça que sobe do rio gelado,
A pétala que estala ao abrir-se o botão.
Por lá, os estoques de hormônios envelhecem
Enquanto a relva escorrega nas vísceras da manada.
Não deixe que os olhares do potro
Assistam a sua passividade camponesa...
Faltará existência se se puser na mira desses vulcões invisíveis.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009


EMBALO
DE
CHARRETE



Noto a corte de insetos contornando a pedra.
Tudo à volta é borra de mistério.
O rio fecha os olhos e as margens se tocam.
Onde está a dor no meio desse verde-castanho?
A dor do menino que já passou...
A dor que ele ainda pode sentir...
Abra os olhos, Rio!
Deixa a sua alma desabar pelos vergéis,
Entrar na capoeira e desabrochar na várzea!
Suas mãos brilhantes trazem dos barrancos
O humus de esperança que lá na frente
Vai saciar a sede de fertilidade do menino.
Não há melhor analgésico que a semente brotando
No peito assediado pela sedução da vida.
Em setembro, quando a terra forra-se do ipê,
Vou me casar com a Natureza,
Dormir tranquilo, acordar sem medo,
Sem lembrar da saudade
E das histórias que esqueci de contar para o meu menino
Porque precisava sorrir urgentemente.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

ELA VAI

Ainda que nada mais seja segredo,
Ainda que nada mais tenha mistério,
Ela deixará seu sangue correndo nas veias
E partirá, mesmo sem decisão ou escolha.

Ainda que haja dia o tempo todo,
Ela saberá viver sem o destino a molestá-la
E partirá mesmo que rumo outro
Tenha a marca de muitas e fundas pegadas.

Ainda que haja firmeza em tudo o que a faz ficar
E haja até a certeza impossível vencendo as ambiguidades,
Ela irá contra o vento, as marés, as conjunturas,
Ignorando que foi contra as juras cansadas.

Ainda que a fé não a açoite,
Ainda que nunca aceite chegar pra onde irá,
Todos os santos a levarão dentro do peito,
Num carnaval silencioso ensurdecendo a noite.
Ela caminhará sem pés e sem veículos,
Pois todo o movimento que a concerne
De repente nada mais move.

Não voará, navegará, cavalgará, nem levitará...
Ela vai como se já tivesse ido!
Porque o feitiço é imponderavelmente maior,
Desmedidamente maior,
Imediatamente maior,
Que os invencíveis Leviatãs.

Nem é para o bem, porque os sistemas binários
Se fragmentaram em tal atropelo
Que as leis do enquanto não se aplicam aos universos.
Ela vai, e só não aleatoriamente porque tomou os acasos
de assalto.
Nem vai com jeito de ir porque seu eu,
Antes sem ego, agora sem coração e cérebro,
Não sabe nome de nenhum verbo.

Ela vai sem que alguém a espere
E sem que essa orientação
Seja resposta para suas dúvidas.