sábado, 9 de abril de 2011






MANDATO


Lendo a jazida opaca e dura, em seiva solvida se descomplica, translúcida. Por toda a manhã fulgura. Quando a tarde se esforça, fica e se aguça. À noite, apenas reduz-se, luz escura. A vida é pra agora - que siga! No fedor da boca que devora a podre espiga, se revigora. No horror do que a fez, mesmo assim, extertora infinda e funda. É mandato, tão rica de desejo e aventura. Arremete em calma, do zero ao fim da alma, levando entre as mandíbulas um cordão de estrelas. Acontece, à revelia dos enredos, no meio da confusão e dos medos, do azáfama à combustão, do amálgama à fusão, do esmalte ao nervo, com os mais sinceros sins na oclusão da arcada, numa mordida exata, como a de uma felina e a ninhada. Resplandesce, livre de ensejos. Brilha até quando escura. A vida factível não esmorece, apesar de os corpos néscios não se erguerem em sua honra. Sobe a um nível sem andares, firme nas próprias gangorras. Ergue-se visível, sem imagens. Resto do todo, uno e esfacelado, que se retempera ao se partir. Fração do nada, ainda é ela quando algo se acaba. Logo ao se definir, não importa o que lhe ocorra. Lida a jazida onde, rútila em prismas, está compreendida, pejada e fonte de albor expira a última necessidade de interpretar o que é dor.


Foto: Martina Gusman, no filme "Leonera", de Pablo Trapero